Desde a publicação da Resolução 56 do CONTRAN (21 de Maio de
1998), o Certificado de Originalidade (Placa Preta) vem sendo
mal interpretado e, o que é pior, muitas vezes mal utilizado. No
Brasil, quando algo envolve dinheiro ou poder, sempre surgem
aproveitadores, e o meio Antigomobilista não é exceção. Muitos
assumem cargos em entidades tendo como objetivo principal a
obtenção de vantagens, sejam elas econômicas ou sociais
(status).
As primeiras planilhas de vistoria (confeccionadas por clubes) que surgiram após a Resolução
56 eram, como tudo no início, muito “precárias”, isso sem contar
o erro da resolução em relação à idade mínima de fabricação.
Erro que foi fruto de uma minuta mal redigida
(propositalmente?).
Até o ano de 1999, apenas 5 entidades eram credenciadas pelo
DENATRAN (três delas utilizavam procedimentos e planilhas
similares – elaborados pela FBVA... as outras duas utilizavam
procedimentos e planilhas criadas por eles próprios).
Vários
veículos foram emplacados nessa época. Muitos erros foram
cometidos... era o início...
A
tendência era uma evolução com o passar dos anos... mas, ...
Não
demorou muito e a “placa Preta” começou a ser utilizada com
outros fins (principalmente como justificativa para afiliação) e
posteriormente no meio “comercial”. Associado a isso havia
também uma grande desinformação no meio antigomobilista.
As
entidades passaram a cobrar taxas, que aumentavam constantemente
visando, dentre outros, “arrecadar mais”.
O Certificado de Originalidade passou a “ser considerado” apenas
um documento para “facilitar” o uso/circulação de veículos
antigos... e, para muitos, como objeto de “comércio” ou status.
A “Placa Preta” foi criada com o objetivo de preservar os
veículos antigos “com mais de 30 anos de fabricação”, que são
“mantidos como objeto de coleção”, que “ostentam valor histórico
pelas suas características originais” e que “mantém em pleno
funcionamento os equipamentos de segurança de sua fabricação”.
Pelo texto acima (do certificado de originalidade, anexo da
Resolução 127 CONTRAN) chega-se à conclusão que o objetivo
original deste certificado (Placa Preta) é preservar os veículos
antigos (originais ou restaurados) que conservem suas
características originais de fabricação, tornando-os verdadeiros
“museus sobre rodas”.
O objetivo
é preservar a história.
E este só será alcançado se o veículo realmente tiver um alto
grau de originalidade, ou seja, preservar suas características
originais de fábrica.
Muitos se
perguntam: E o que é “alto grau de originalidade”?.
Alguns
itens dos veículos, por possuírem características singulares ou
terem efeito estético significativo no conjunto, não devem ser
retirados ou substituídos e sim restaurados ou reproduzidos (por
exemplo: os freios “tipo varão” dos “fordinhos”. Sua
substituição por outro sistema mais moderno (hidráulico, por
exemplo) causa uma descaracterização grande, pois são elementos
singulares e históricos – além do que o texto legal do próprio
Certificado menciona: “ostentam valor histórico pelas suas
características originais” e que “mantém em pleno funcionamento
os equipamentos de segurança de sua fabricação”.
A
substituição de rodas originais ou opcionais de fábrica, por
outras, mesmo que sejam de época, causa uma descaracterização
estética e também não deveria ser feita.
Da mesma
forma, os vários itens que compõem o veículo devem ter este tipo
de análise (rigorosa e com muito bom-senso)... para se chegar à conclusão do “alto
grau de originalidade” lógico e aceitável. Para isso, deve-se
agir de forma totalmente imparcial, respeitando-se o objetivo da
Placa Preta, e não buscando facilidades ou defendendo
interesses...
Existe uma pequena quantidade de veículos que apresentam
situações/características específicas, seriam uma espécie de
veículos-exceção (são muito raros; estão em
bom estado e nunca foram restaurados; etc). Para estes veículos,
devem ser utilizados critérios que permitam “preservar” o máximo
possível sua história e ao mesmo tempo não prejudicar a
concessão do Certificado de Originalidade. Estes casos são
exceções e devem ser analisados à parte.
Algumas planilhas/procedimentos chegam a prejudicar o verdadeiro
sentido da “Placa Preta” e até servem de “incentivo” para que
determinado proprietário de veículo (e muitos outros) venham a
fazer, sem realmente serem necessárias, modificações (pois sabem
que serão “aceitas”). Ou até mesmo servem de incentivo a que não se
busque a originalidade do item, afinal “é aceito” assim.
São
planilhas e procedimentos que aceitam alterações de itens que na
maioria das vezes, não têm justificativa lógica e plausível, e
afetam significativamente a “história” e/ou a estética do
veículo, por exemplo: a troca de motores, a troca de sistema de
freios, a troca de rodas, descaracterizações na pintura, etc.
Aceitar
tais modificações só seria justificável em situações
especialíssimas nas quais seria impossível, ou quase, a
recuperação ou reprodução do original. Hoje é possível fazer
recuperação ou reproduzir quase tudo e de forma idêntica ou
similar ao original.
Muitos Clubes, que utilizam determinadas planilhas, até por uma
questão de isonomia, pois fazem parte de um mesmo grupo, estão
buscando e conseguindo uma ampliação na “aceitação de
substituição de item”. Houve alegações do tipo: “se
determinado veículo “X” pode, por exemplo, substituir o motor (e
não seria um caso de exceção) por que veículo “Y” também não
poderia?.”
Este "afrouxamento" nos critérios acontece por quê? Para
preservar os veículos com valor histórico? Com certeza não!
Para satisfação de proprietários?
Talvez!
"Placa Preta" é para ajudar a
preservar veículos com valor histórico, originais, e não para
todo veículo com mais de 30 anos de fabricação.
Se não
houver uma conscientização e uma reformulação por parte dos que
distribuem estes conceitos/procedimentos correremos o risco de
termos, no futuro, uma grande frota de veículos “placa pretas”,
a maioria descaracterizados, de pouco valor histórico original.
Além do prejuízo causado à história... (o que é pior) pois tais
veículos, por ostentarem a Placa Preta, serão “considerados
pelos leigos” como representantes do original de fábrica.
A maioria dos clubes não disponibiliza para o proprietário do
veículo, uma cópia da vistoria. Alguns alegam que a planilha é
“um procedimento interno” que só interessa ao clube.
Tal
procedimento, além de obscuro, pode prejudicar o proprietário,
que é o maior interessado em saber “como” foi feita a vistoria e
qual a pontuação atribuída a cada item. Para que possa promover
futuras melhorias no item que recebeu pontuação baixa...
Há planilhas que obrigam o vistoriador a avaliar “em conjunto”
se o item era original e o seu estado de conservação e,
“misturar” original+conservação, para marcar uma pontuação...
Tarefa extremamente subjetiva.
Como a
originalidade e estado de conservação são variáveis distintas, a
sua mesclagem não é possível sem utilizar-se de subjetivismo.
Talvez
seja este o motivo do não fornecimento ao proprietário de cópia
deste tipo de vistoria... O risco de se detectarem disparidades
é enorme...
Também nesse ponto há
necessidade de uma conscientização e de uma reformulação por parte dos
usuários destes procedimentos.
A vistoria
deve ser feita com a utilização de critérios e procedimentos
essencialmente lógicos e mais objetivos possíveis.
E, por uma
questão de transparência, o proprietário deveria receber cópia
(para saber o que foi feito e até para, eventualmente, contestar
alguma pontuação... vivemos numa democracia...). Não há motivo
justificável, desde que a vistoria tenha sido bem feita, para se
ocultar a pontuação atribuída aos itens.
Outro fator que facilitou e ainda facilita a concessão de
Certificados de Originalidade por interesses diversos (adotada
por grande parte dos clubes) foi a atribuição exclusiva ao
presidente de assinar (conceder) o certificado. Quando a
responsabilidade é distribuída para mais pessoas (em conjunto),
a possibilidade de “irregularidades” ou “erros” tende a
diminuir. É como diz aquele ditado : “...se as 3 chaves
que abrem o
cofre estão com uma mesma pessoa, a possibilidade de acontecer
algo é maior...”.
O meio antigomobilista
conhece vários casos de presidente de clube que se utiliza
desta “prerrogativa” para conceder certificados sem a utilização
de critérios lógicos e em desacordo com os objetivos da “Placa
Preta”.
Não temos visto entre as entidades (clubes) atitudes com vista à
cassação de Certificados de Originalidade emitidos sem muito
critério. É verdade que existem no meio aqueles que não querem
tomar nenhuma atitude, pelo contrário, fazem este tipo de
emissão regularmente.
Mas, e
quanto aos demais? Será que também não há interesse? Ou não há
um termo de responsabilidade assinado pelo proprietário que
possibilite isso?.
Se houve erro
na emissão do Certificado de Originalidade, por deficiência ou
falhas nos critérios, já estaria na hora de se fazer uma revisão
(convocando os veículos para nova vistoria).
Um
processo de cassação pode até ser trabalhoso, mas o efeito
moralizador seria grande... Aí sim poderíamos separar o
“joio” do “trigo”. E hoje, quem tem maior poder para
desencadear um processo que vise à cassação da Placa Preta é a
entidade que emitiu o Certificado e possui o Termo de
responsabilidade assinado pelo proprietário. O problema é quando
a entidade não quer ou então acha certo alterações que vão
contra o verdadeiro sentido da "Placa Preta".
Uma questão a se pensar: Por quê alguém quer colocar a "Placa
Preta" em seu veículo?
Por "Status"?; pela suposta
"valorização"?; para evitar problemas quando em trânsito?; para
satisfação do ego?, etc, etc, etc.
Quantos colocaram a "Placa Preta"
em seu veículo tendo como pilar norteador o verdadeiro sentido
do instituto "Placa Preta" (preservar veículo de valor
histórico)?
E com relação a alterações?
quem tem um veículo com
alterações, por exemplo, com rodas que não são originais ou não
são equipamento opcional de fábrica (e pensa que isto está
certo), esquece-se que está havendo uma afronta ao verdadeiro
sentido do Certificado de Originalidade e que estas alterações,
quase sempre injustificáveis, são feitas apenas para uma
"satisfação pessoal".
Infelizmente é um fato: O Brasil é
o País da "Lei de Gerson".
Este texto é um alerta geral para que possamos repensar a
situação atual... e fazermos a nossa parte... em busca da
moralização da “Placa Preta” em seu sentido original (preservar
a história...) deixando de lado interesse puramente pessoal.
João Marin
(Juka), Londrina-PR, 22/02/2007
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